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Nostalgia em pleno carnaval


Certa vez, faz uns 15 anos, eu convidei Ignácio de Loyola Brandão para fazer uma palestra na Secretaria Estadual de Meio Ambiente, pasta que dirigia no governo de José Serra. O propósito era, na presença de personalidades da sociedade, promover atividades que agregassem cultura e cidadania à minha equipe de trabalho.

Muito atencioso, o querido escritor do inesquecível “Não Verás País Nenhum” e de tantos outros contos e romances extraordinários confessou um drama particular, comum a todos os articulistas e colunistas de jornais e revistas: como escolher o tema de sua próxima crônica.

Ao contrário do que muitos, naquela plateia curiosa e atenta, reunida no auditório da Cetesb, pudessem imaginar, em boa parte dos casos, disse Ignácio, a definição não partia de nenhum planejamento editorial ou de um grande insight, mas surgia do fatídico prazo para o envio do texto para publicação.

Lembrei-me dessa singela história quando, dias atrás, sentei em minha escrivaninha pensando sobre o que escreveria para ser publicado nessa 3ª feira de Carnaval, 21 de fevereiro de 2023. Falar sobre o quê, numa data destrambelhada dessas?!

Não é a 1ª vez que me defronto com tal dilema, pois, afinal, faz tempo que me oferecem a gentileza de ocupar as páginas de veículos de comunicação, como destacadamente me propiciou Rui Mesquita, no Estadão, jornal em que escrevi regularmente na famosa página 2 por vários e bons anos.

Uma das coisas que aprendi foi que o timing importa. Por exemplo, quem, como eu, escreve mais comumente sobre as questões do agro não pode deixar de comentar, em sua 1ª coluna do ano, em janeiro, das perspectivas da safra no Ano Novo. Os leitores estranhariam.

Agora –essa é a dúvida– e no Carnaval, querem ler sobre o quê?

Mais de uma vez escrevi sobre o que chamei de o carnaval do agricultor, mostrando o desfile de máquinas e os suores nessa época que, enquanto a cidade cai na folia, na roça está começando a colheita de grãos. É uma forma de pegar carona no assunto dominante e puxar a sardinha para seu lado.

Certa vez pretendi levar os leitores a descobrir como, em pleno carnaval, pode-se notar a presença do mundo rural. Afinal, o couro onde se batuca vem da pecuária, a pena da fantasia sai da avicultura, o papel do confete e da serpentina se origina na silvicultura e, principalmente, sem cana-de-açúcar não se fabrica a cachaça da caipirinha. Nem a cerveja gelada existiria se não fosse o trabalho do agricultor nos campos de cereais.

Como percebem, utilizamos subterfúgios para driblar a dificuldade criativa nesses momentos de distração coletiva. Não dá, afinal, para ser sério, ou acadêmico, quando a maioria se distrai na farra e cai nas cantorias e gargalhadas de Carnaval.

Ah, tem aqueles que não gostam dessa folia, então vou tentar escrever para os carrancudos, gente como eu, que já passamos da idade de ficar vendo essa bagunça, uma pegação barulhenta que não mais atrai minha geração criada na Jovem Guarda.

Soa ridícula a hipótese. Seria como trair minha ranzinzice em público.

Então, prefiro apenas contar que, após aquele convite, o Ignácio de Loyola Brandão se tornou meu amigo, nós que já éramos próximos de origem, quase conterrâneos por conta da sinonímia, pois ele, nascido em Araraquara, e eu, em Araras, nos sentimos meio aparentados. Ambos somos “arara”, sabe-se lá o que isso signifique.

Conversa vai, conversa vem, constrangido como qualquer caipira frente a uma celebridade, tive a ousadia de lhe passar às mãos a redação final de meu novo livro “Almanaque do Campo”, que tinha finalizado naqueles dias. Para alegria de meu editor, o Marcelo Duarte (Ed. Panda Books), ganhei uma “orelha” maravilhosa de apresentação de minha obra, assinada por essa lenda generosa da literatura nacional chamada Ignácio de Loyola Brandão.

Minha crônica de Carnaval, assim, inesperadamente homenageia a escrita. Nesses dias fugazes de rápidas mensagens, que deixam esquecida a leitura, como é bom se lembrar do tempo que, lá na fazenda Santa Clementina, ou alhures, a molecada como eu e o Ignácio líamos almanaques e enciclopédias para compreender o tamanho do mundo em que vivíamos, encantados pelo conhecimento científico e por suas infinitas fronteiras, que nos levavam a abrir nossos horizontes.

Em setembro de 2010 fizemos o lançamento do Almanaque do Campo lá na Livraria Cultura, no Conjunto Nacional, em São Paulo. Essa mesma que agora se decretou a falência.

Em pleno Carnaval, quedei-me na nostalgia. Fechar uma livraria como a Cultura significa virar uma página da história do país.


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    Referências

    www.agricultura.gov.br
    Ministério da Agricultura - Portal da
    Agricultura, Pecuária e Abastecimento

    www.embrapa.gov.br
    Embrapa - Empresa Brasileira de
    Pesquisa Agropecuária

    www.ital.sp.gov.br
    Instituto de Tecnologia de Alimentos

    www.alimentosprocessados.com.br
    Alimentos Processados

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