No passado o direito à propriedade da terra compreendia o domínio absoluto sobre os animais silvestres, as árvores, a água e o uso do solo.
A legislação sobre o uso de recursos naturais foi modificada de tal forma que deixou de ser propriedade do agricultor, mesmo com a escritura registrada e legal.
A água, a partir da legislação vigente, passou a ser patrimônio da União e a distribuição, o uso e a remuneração definida por membros dos comitês de bacias hidrográficas. As árvores nativas poderão ser cortadas, apenas, com licença específica e com reposição controlada. Portanto, as florestas e as árvores não são mais propriedade e de uso do homem, como se fossem um bem pessoal.
A legislação que protege animais silvestres, água e árvores, em alguns casos têm penas mais rigorosas do que as relacionadas a crimes contra seres humanos. Não há mais dúvidas sobre os crescentes rigores das leis e das demandas da humanidade para a conservação e recuperação da fauna, da flora e a preservação de recursos hídricos.
Além dos aspectos relacionados com a água e as árvores, a legislação recente sobre o uso da terra passou por mudanças profundas. Estão sendo definidos novos parâmetros que estabelecem índices de produção. Se a eficiência mínima não for alcançada, a terra poderá ser desapropriada, mediante indenização e repassada para outras atividades ou para pessoas com maior habilidade de uso.
A necessidade de maior eficiência no uso da terra, da água e da biomassa determinou mudanças na legislação, que há duas décadas eram impensadas.
As demandas sobre o uso adequado da terra e o manejo da água e do carbono são uma realidade nos mercados mais exigentes da Europa, que está definindo parâmetros de boas práticas agrícolas (GAP – Good Agricultural Practices) e estão sendo usados como padrões de referência mundial.
A rastreabilidade já é aplicada como parâmetro na exportação de carnes e para continuar no mercado de melhores preços é necessário adaptar-se às demandas dos consumidores mais exigentes.
Em agricultura as perdas de solos por erosão e a queima de palha são práticas inaceitáveis e resolvidas pelos agricultores que adotam o plantio direto com cobertura permanente. Os que continuam adotando práticas que degradam o ambiente deveriam ter a habilitação para uso da terra cassada.
Nos Estados Unidos as práticas de conservação de solos têm parâmetros definidos como critérios para acessar benefícios financeiros diretos, financiamentos e habilitação para seguros. Parâmetros de escoamento de água das chuvas, índices de cobertura de solo com palha e planos de reservas de áreas para conservação de recursos naturais já são de uso consagrado.
Em Portugal foi aprovada legislação, em abril de 2009, que obriga os produtores de grãos a adotar o plantio direto e fazer a rotação de culturas, para habilitar-se na obtenção de benefícios fiscais e ajudas financeiras do programa de política agrária comum (PAC) da Europa, que chegam a 600 euros por hectare.
No Brasil a habilitação e atualização de conhecimentos já estão sendo difundidas pelo PI (Produção Integrado) do Ministério de Agricultura, preconizando a adoção de boas práticas agrícolas e rastreabilidade, porém, ainda de forma tímida.
O agricultor e todos os componentes da cadeia de produção, desde a geração de conhecimentos, fornecedores de insumos, a indústria e comércio de alimentos necessitam trabalhar de forma integrada para se adiantar às demandas reais do mercado e atender a demanda das novas legislações, assim, participando de forma diferenciada do negócio de alimentos.
Pode-se dizer que em agricultura, à semelhança da necessidade de habilitação (CNH - Carteira Nacional de Habilitação) para dirigir um automóvel, estão sendo estabelecidas normas que exigem habilitação do homem (CNHAgricultura) para usar e manejar solos e recursos naturais para a produção de alimentos e fibras. O agricultor habilitado e usando boas práticas agrícolas deve ter benefícios fiscais e facilidades para obtenção de crédito, além de subsídios para seguro de renda e produção. Os que transgridem as normas de boas práticas devem ser penalizados com a cassação da habilitação em casos graves como a queima de palha e aração com riscos elevados de perdas de solos por erosão. Outras “infrações” como a falta de rotação, baixos teores de matéria orgânica, produções abaixo dos índices mínimos, qualidade física e biológica do solo poderiam resultar na soma de pontos, que levariam á necessidade de um curso para renovar a habilitação para uso da terra e manejo de recursos naturais. Ou seja, estar habilitado para fazer agricultura, com a gestão da produção, do uso de recursos naturais e da geração de renda.
Portanto, para acompanhar as demandas e exigências é necessário habilitar-se. Quem estiver manejando recursos naturais de forma inadequada poderá ter dificuldades para continuar usando a terra e a água, ou poderá ser encaminhado para cursos de reabilitação. Periodicamente deverá ser feita uma reavaliação dos métodos e da eficiência na produção de lavouras, com a exigência legal de atualização técnica para renovar a habilitação para uso da terra e de outros recursos naturais.
A importância destacada que o agricultor tem no manejo de biomassa e os benefícios gerados pelos que adotam boas práticas, com o fornecimento de alimentos baratos para a humanidade e, ao mesmo tempo, manejando recursos naturais (água e solos), devem ser reconhecidos e beneficiados, enquanto, os demais devem ser habilitados para as novas demandas dos mercados e das gerações futuras.
Dirceu N. Gassen